sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Roosevelt, Gonçalves Dias e a sua carreira



João é um profissional dedicado. Tem iniciativa, dá ideias e está sempre com vontade de fazer mais e melhor. Ele se esforça para a melhor entrega e tenta encontrar novas formas de fazer o seu trabalho mais produtivo.

Pedro é mais acomodado. Segue as ordens do chefe, procura não fazer nada mais do que sua obrigação. Gosta e até protege sua zona de conforto no trabalho. Segue a direção da maré e nunca traz para si novas responsabilidades ou oportunidades que podem significar mais trabalho.

Qual destes dois profissionais apresenta mais chances de cometer erros? Muito provavelmente o que tem mais iniciativa, por tentar produzir mais e melhor. E que certamente é muito influenciado pela postura de seu chefe.

Silvia é uma profissional que se arrisca. Dá voz a suas ideias, defende seus pontos de vista, sabe ouvir atentamente os colegas e procura o consenso por meio do diálogo.

Adriana é mais quieta e obediente. Dificilmente discorda, faz o que lhe pedem, mas se mantém em silêncio e a uma distância que considera “segura” dos outros.

Qual das duas está em posição mais vulnerável dentro da empresa? Qual tem melhor conexão com a empresa e o time? Novamente, a influência do líder é fundamental.

Estes perfis refletem diferentes personalidades, encontradas em praticamente todas as empresas, e sobre as quais acabo de ler um livro muito bom: Daring Greatly. A autora Brené Brown, pesquisadora da Universidade de Houston sobre vergonha e vulnerabilidade, fala sobre a polarização do comportamento humano nas relações pessoais e profissionais, fruto de mais de 15 anos de estudos sobre temas muito relevantes para o universo do trabalho, tais como vergonha x culpa, omissão x engajamento, silêncio x conexão, falta de diálogo x vulnerabilidade.

O título do livro vem do trecho de um discurso de Theodore Roosevelt, cuja tradução me arrisco a seguir (*):

Não é o crítico que conta; nem aquele que aponta como o forte tropeça, ou onde o autor do feito poderia ter sido melhor.

O crédito pertence ao homem que, de fato, está na arena; cuja face é marcada por poeira, suor e sangue; aquele que luta com coragem, que erra, que vacila e cambaleia, de novo e de novo, porque não há esforço sem erro e hesitação;

Aquele que realmente se esforça para as proezas, que conhece o grande entusiasmo e as grandes devoções, que se entrega e consome por uma causa valorosa. Aquele que, no melhor, conhece o triunfo da realização ao final; e que, no pior, se ele falha, ao menos falha na ousadia grandiosa…

Inúmeras pesquisas apontam o protagonismo e a iniciativa dos profissionais como características muito valorizadas pelas empresas. Estudo recente conduzido por Betania Tanure com 250 altos executivos de grandes empresas no Brasil revela dados alarmantes: 61% dos entrevistados dizem que as metas estabelecidas para diferentes áreas competem entre si (conflitos sobre qual a estratégia e direcionamento da empresa); 68% admitem que seus colaboradores não conhecem a estratégia da companhia (falta de compreensão que gera falta de engajamento); 70% dos executivos consideram seus funcionários acomodados (zona de conforto que significa inércia).

Ou seja: quem faz parte das equipes destas empresas está vendado, prostrado e com o tapete sendo puxado por outras equipes da própria organização.

Como é possível alguém ter iniciativa ou ser protagonista se não sabe a direção a ser seguida, se não tem energia e se as armadilhas internas na empresa são uma certeza? Como ousar de forma grandiosa sem disposição, direcionamento ou segurança?

As empresas querem pessoas que pensem fora da caixa, que façam mais com menos, que inovem, criem e realizem com maestria. Mas precisam de líderes que criem ambientes propícios para isso. Líderes que equilibrem a visão de curto prazo do bônus do final de ano com um projeto sustentável e de valor. E que busquem (mesmo que, para isso, tenham que trocar) os melhores talentos para realizar sua estratégia.

É difícil encontrar este tipo de profissional – tanto líder como liderado. Um profissional que ouse, mexa, lute e se entregue de corpo e alma para sua luta na tal arena descrita por Roosevelt.

E, quando estes profissionais são encontrados, tão ou mais difícil é engajá-los e mantê-los motivados, sintonizados e a bordo do rumo escolhido pelas empresas.

Daí a importância do propósito, da direção. Ter clareza no rumo da vida pessoal, estratégia profissional ou da organização, para dedicar esforços que estejam alinhados com este norte, que coloquem toda a energia e iniciativa na direção estabelecida.

Conhecer, avaliar, aprofundar e trabalhar. É o que os profissionais e as empresas precisam fazer. Seja para um projeto, uma carreira ou estratégia empresarial. E fazer tudo de novo, dali a algum tempo, para um novo ciclo, revalidando as premissas que sustentaram os primeiros passos, para ter certeza que a trajetória não mudou, ou que não mudaram os protagonistas no meio do trajeto.

O que me lembra do poema Canção do Tamoio, de Gonçalves Dias, que acabei por decorar quando tinha uns 12 anos de idade, porque um colega de sala praticava todos os dias nas aulas de Português para um concurso da escola, declamando para a sala:

Não chores, meu filho;
Não chores, que a vida
É luta renhida:
Viver é lutar.
A vida é combate,
Que os fracos abate,
Que os fortes, os bravos
Só pode exaltar.
As armas ensaia,
Penetra na vida:
Pesada ou querida,
Viver é lutar.
Se o duro combate
Os fracos abate,
Aos fortes, aos bravos,
Só pode exaltar.

O significado é similar ao discurso de Roosevelt. Temos que ser protagonistas da arena de nossas carreiras e vidas. Como seres humanos, como lideres, como profissionais. Devemos ser os tamoios de nossas conquistas e nos responsabilizar por elas. Para isso, precisamos ter a direção muito clara. Lembrando que a chance de sucesso é sempre de 50%. Assim como a de todos os que tiveram sucesso um dia, e que começaram com a decisão de tentar.

De novo, a importância da iniciativa, de se arriscar, se expor, se lançar ao desconhecido. Pode ser em uma simples discussão de projeto no trabalho, decisão de qual estratégia seguir, escolha de um novo emprego ou time de talentos, mudança de empresa ou planos de uma nova carreira.

A arena está aí.

O chamado é diário.

E a postura para a luta, uma escolha individual.

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(*) Versão original

It is not the critic who counts; not the man who points out how the strong man stumbles, or where the doer of deeds could have done them better.
The credit belongs to the man who is actually in the arena, whose face is marred by dust and sweat and blood; who strives valiantly; who errs, who comes short again and again,
because there is no effort without error and shortcoming; but who does actually strive to do the deeds; who knows great enthusiasms, the great devotions; who spends himself in a worthy cause;
who at the best knows in the end the triumph of high achievement, and who at the worst, if he fails, at least fails while daring greatly…
(Theodore Roosevelt)

Fonte: Exame Abril

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